FICHAMENTO DO CAPÍTULO “INTERPRETAÇÃO /REPRESENTAÇÃO” DE A ARTE DE NÃO INTERPRETAR COMO POESIA CORPÓREA DO ATOR, DE RENATO FERRACINI.
Nesse capítulo, o autor discute os conceitos de interpretação e representação no nível teatral, analisando técnicas e pensamentos dos principais autores e épocas da história do teatro. A análise é feita comparando-se, em alguns momentos, trabalhos realizados pelo grupo LUME ao longo de sua história. Abaixo, seguem-se os aspectos textuais do capítulo que mais me chamaram a atenção.
Conceitos de interpretação e representação não no sentido filosófico, linguístico ou semiótico, mas sim nos diferentes modos de pensar do ator.
Interpretação- ligação direta com o texto; a personagem existe e o ator faz a mediação entre texto, personagem e plateia.
Todos os dados e informações para a construção da personagem são buscadas no texto.
Representação- a personagem “pre existe”, isto é, está potencializada no corpo do ator, que cria, através de ações físicas e vocais orgânicas codificadas , a identidade de sua personagem.
O processo de criação é, portanto autônomo, orgânico. O resultado do trabalho (a cena) é produto de um trabalho individual e cotidiano.
A criação de cada ator nada tem a ver com o texto original, visto que as ações orgânicas são construídas antes do texto, baseadas apenas no corpo do ator.
Ligâmens- pequenas ligações e transições entre as ações orgânicas.
Processo de aculturação- expressão usada por Eugênio Barba para se referir aos processos de aprendizagem e internalização de técnicas corporais codificadas que são representadas no teatro. Essas técnicas corporais trabalham formas extracotidianas, “uma maneira própria de se colocar em pé, de parar, de olhar, de estar sentado (...)” e a energia do ator.
Sobre a técnica de aculturação, KUSANO mostra que:
-há a eliminação de qualquer elemento acessório, restando apenas o essencial;
- deve-se fazer o mínimo de gestos, buscando-se o máximo de expressão;
- os gestos são sugeridos, não mimetizados;
-princípio do corpo aos 7 /10;
No ocidente, os atores não interpretativos pouco usam da aculturação, mas partem de técnicas pessoais de representação. (técnica de inculturação).
Vale lembrar que a história do teatro ocidental muitas vezes é confundida com a história da literatura dramática, justamente pela materialidade do texto, que permanece. Foram poucos os momentos em que o trabalho de ator fosse independente do texto, talvez apenas durante o período da Commedia dell’ arte.
O ator na historiografia
Grécia- “(...) a íntima relação entre o ator e o texto dramático, já que o primeiro ator representava- interpretava o papel que ele próprio escrevia.” (FERRACINI, p. 39). Referindo-se ao trabalho do primeiro ator, Téspis.
Com Ésquilo ( pai da tragédia) e Sófocles, aumenta- se o número de atores em cena.
- uso de máscaras e coturnos que modificavam o corpo do ator- destaque da voz.
Roma- Surge na cidade de Atelas, as Atelanas, manifestações teatrais que usavam máscaras, improviso, diferentes espaços urbanos, etc.;
Também havia os Mimos, manifestações teatrais que não utilizavam máscaras, mas apenas o corpo, buscando-se elementos de danças primitivas.
As decadências sociais e morais da sociedade romana reverberaram no teatro durante o período final do Império Romano. Nessa época, houve atores “escravos” das companhias, alguns dos quais, depois de suas “cartas de alforria”, montavam companhias. A encenação dessa época buscava “realismo” através de cenas com mutilação, violência física, sexual, verbal, injúrias, etc. Foi assim que durante o período final do Império Romano também o teatro estava decadente e as plateias viam com “náuseas” e recusa as peças.
Idade Média- A Igreja perseguia, censurava e condenava atores e suas famílias. Apesar disso, muitos sobreviveram à clandestinidade, mantendo a evolução teatral. Já no séc X, passa a usar o teatro como instrumento de catequização-- os tropos (pequenos diálogos poéticos musicais) culminaram os Mistérios, grandes espetáculos de rua religiosos, no séc. XVI.
Na página 44, o texto mostra que o aspecto ritualístico dos Mistérios, a clareza da mensagem bíblica, o contraste com o teatro profano popular eram os aspectos mais importantes. Portanto, a atuação e a criatividade do ator ficavam em segundo plano. O autor do texto coloca que os atores dos Mistérios não representavam nem interpretavam, tinham “uma relação simplesmente alegórica no que diz respeito à cena.”
Renascimento- antropocentrismo, recuperação do modo helênico de representação, comédias de Plauto, recuperação do sistema de Aristotélico, apresentações em espaços fechados, que culminava na gesticulação concisa e a declamação da palavra--- Commedia dell’ arte, em contrapartida, propiciava laboratórios de criação; escola de atores.
DUALISMO TEATRO LITERÁRIO X TEATRO POPULAR retratado por Ruggero Jaccobi:
TEATRO LITERÁRIO TEATRO POPULAR
-Das cortes;
-Escrito;
-Baseado em modelos gregos e latinos;
-Não consegue alcançar resultados propriamente teatrais. -Do povo;
-Improvisado a partir de um roteiro (o canovaccio) e de sua partitura física e musical;
-Baseado nos costumes das classes populares, quase não tem modelos e formas fixas;
-Alcança resultados exclusivamente teatrais.
Nesse tipo de representação, os atores trabalhavam o improviso com as personagem, isto é, representavam personagens (codificadas) mas improvisava-as com suas partituras física e vocal e o contexto da apresentação, isto é, plateia, lugar, tempo, etc.
Carlo Goldoni, no séc. XVIII, textualiza a comédia, colocando novamente a literatura como “senhora da cena”.
O ator no Oriente
As técnicas codificadas de representação perpassam gerações e os atores começam o treinamento de seu papel, que provavelmente será o da vida toda, desde crianças. Aprendem a controlar a energia que será gasta em cena; a executar gestos e ações minuciosas, mas bastante expressivas, que representem organicamente os símbolos sociais. Há uma estreita relação entre representação extracotidiana e religiosidade.
Princípio da negação a ação sempre começa na direção oposta àquela do destino final.
Butô- a principal característica está no processo de elaboração técnica individual do performer.
Dançar os sentimentos , segundo a dançarina de Butô Natsu Nakajima, é dançar todos os elementos da natureza.
Contemporâneos
Stanislavski-
1 etapa: trabalho do ator sobre si mesmo - descobrir as potências, as energias, técnicas para buscar no inconsciente a fonte criativa do ator (memória emotiva, se mágico) em que o ator agiria como si mesmo nas situações.
2 etapa: trabalho do ator sobre a personagem
Com o desenvolvimento do “Método das ações físicas” passou-se a preocupar-se em fixar ações físicas e não mais sentimentos, que por estarem no campo do inconsciente, não poderiam ser manipulados pelos atores.
Meyerhold
O papel dos movimentos cênicos é mais importante que qualquer outro elemento teatral.---- Raízes do teatro pobre de Grotowski?
Biomecânica - racionalização e precisão total dos movimentos.
Artaud – Estudo e prática de uma linguagem teatral física que desperte os sentidos do espectador. Propõe a criação total, a transgressão, no palco, do habitual cotidiano e ampliação dos limites da arte.
O teatro ritualístico, uma comunhão entre corpo, alma, espectador.
Grotowski- técnica pessoal de representação através de exercícios de desbloqueio de obstáculos que impedem a realização total de um ato teatral.
estímulos impulsos reações.
Brecht- propõe que o ator conheça profundamente relações e comportamentos sociais para demonstrá-las de forma consciente, descritiva e sugestiva.
Eugenio barba e Odin Teatret- técnica pessoal de representação; uso de materiais e diversas possibilidades de movimentação corpórea, descontextualizando as ações físicas do significado cotidiano dos verbos; uso do corpo inteiro para desenvolver uma ação.
Semiótica-
o ator deve buscar sua gestualidade em si mesmo, e não se integrar em um sistema preexistente de signos. Dessa forma, não somente o gesto do ator não é conhecido como expressão de um significado preexistente ao nível da linguagem, mas ainda, a gestualidade emancipa-se totalmente do discurso, constituindo-se uma semiótica autônoma (FERRACINI, p. 80)
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